Os sitiados na cidade estão protegidos em trincheiras e bunkers numa rede infindável que cerca a urbe por todos os lados e atravessa ruas e vielas. Os defensores aguardam um ataque iminente alertado pelas antenas de radar que ainda restam após os sucessivos ataques aéreos e de mísseis da primeira onda, toda a infraestrutura da cidade transformou-se em ruínas fumegantes. O nível elevado de radioatividade medido recentemente indica o uso de munição de artilharia enriquecida por uranio, arma tática que foi usada pela primeira vez no séc. XX na Guerra do Iraque dos EUA. A água ainda disponível está contaminada e escassa. O racionamento dos recursos leva os sitiados a situações extremas, há um mercado negro macabro de corpos. Nas trincheiras a expectativa do ataque gera nervosismo e aumenta a tensão dos defensores. Alguns rezam. Outros olham seus celulares, a rede funciona só em alguns pontos que restaram na cidade e sofrem manutenção constante, alguns mandam mensagens de despedida ou recitam testamentos. As sirenes entoam por fim seu canto maligno de dor e morte que se avizinha. Ao longe, pequenos pontos escuros vão tomando uma tonalidade metálica, uma forma crescente amorfa ao refletirem suas blindagens nos últimos raios de sol do dia que declina. São drones militares, milhares deles, de todos os tamanhos, o silvo da artilharia começa, descem granadas e foguetes sobre os defensores que respondem com barreiras de fogo cerrado de lançadores antitanque portáteis com mira laser. Explosões ao longe depois de alguns segundos de espera até os projéteis atingirem seu destino. Um grito de hurra percorre as fileiras e mais uma cortina de granadas propulsadas é enviada em direção ao inimigo. A resposta é imediata. Misseis de cruzeiro, duas ogivas termobáricas de meio quiloton lançadas de navio a milhas de distancia atingem seu alvo com precisão, caem sobre as defesas da urbe causando baixas e duas grandes crateras no solo. Todos os sinais eletrônicos cessam imediatamente com a onda eletromagnética produzida pelas explosões. Nenhum dispositivo eletrônico funciona mais. Abre-se uma brecha na defesa. Onde antes haviam homens nada resta, nem mesmo os vestígios das ruínas antes calcinadas, foi tudo pulverizado ao redor do ponto de impacto pelo calor intenso. Duas nuvens de fumaça no formato de cogumelos sobem ao ar depois da liberação do calor da explosão que dissolveu tudo a volta. Os poucos feridos sobreviventes em estado de sofrimento intenso, com seus órgãos internos colapsados e dissolvidos pelo deslocamento de ar das explosões são mortos a tiros para que não mais sofram.
Os drones de transporte de tropas aos poucos vão aterrisando no campo de batalha. De dentro do seus bojos metálicos, milimetricamente instaladas, saem, abrem suas pernas e se articulam as bestas. Se alinham em formação de combate com suas armas acopladas nos dorsos blindados. São drones de assalto terrestre inteligentes, com quatro patas articuladas, que atingem velocidade considerável no ataque e possuem o mesmo equilíbrio das extintas panteras. Junto a eles seguem os guardiões, homens instalados por biotecnologia dentro de exoesqueletos de titânio. Muitos deles são veteranos incapacitados de outras guerras, aleijados, sem algum membro, e que escolheram este destino como forma de voltar a ativa e ganhar com isto algum dinheiro num mundo sem nenhuma oportunidade. Acompanham de longe suas bestas, dirigidas por controle remoto por soldados analistas confinados a milhas de distancia em algum lugar seguro. Os monitores dos analistas e manipuladores tem toda a visão do campo de batalha a volta, inclusive câmeras dotadas de visão noturna e infravermelho, para detectar o calor dos seres humanos escondidos em algum bunker. Satélites no espaço controlam todos os movimentos no terreno e até embaixo dele. O avanço dos atacantes é veloz, enquanto o que sobrou das defesas da urbe tenta fechar a brecha deixada pelas duas explosões, numa contra ofensiva desesperada, com ataques suicidas contra as bestas que se aproximam céleres das linhas de defesa. Os autômatos cospem tiros das suas metralhadoras giratórias acopladas no dorso e lançam granadas de seus lançadores nas laterais. A concentração do fogo de artilharia dos drones inimigos que sobrevoam a batalha obrigam aos defensores o recuo numa luta desesperada. Drones caça dos sitiados são lançados e tentam derrubar as naves atacantes, mas sua central de controle é logo descoberta e destruída, com precisão total, por uma bomba termobárica antibunker de 1 quiloton lançada de um bombardeiro em alta altitude. A posição da central dos defensores foi detectada por um satélite espião estratosférico que esquadrinhou a localização do fraco sinal emitido. Ao cair a bomba, todo oxigênio existente na sala subterrânea e nos tuneis próximos é sugado matando todos imediatamente. O controle aéreo é por fim conquistado pelos atacantes. Só resta para os defensores recuar para seus tuneis de defesa onde as maquinas tem mobilidade limitada. Os guardiões penetram nos túneis com seus drones localizadores na vanguarda. Para destruir a blindagem do exoesqueleto ou causar algum dano, só com um disparo de um lança granada. Dotados de visão noturna, têm seu sinais vitais controlados por monitoramento a distancia de uma central que permite a visão de outras cameras acopladas nas couraças, uma visão de 360 graus, sendo quase impossível serem flanqueados ou surpreendidos pela retaguarda . Neuro receptores ligados a transdutores levam os comandos para seus poderosos membros e criam uma simbiose perfeita entre homem e máquina, de forma completa e integral transformam estes infantes encouraçados numa só unidade de combate coesa e mortal. Um de seus membros artificiais é um poderoso fuzil de assalto com munição de alto calibre e capacidade para cortar um homem ao meio. Uma besta segue na frente, como batedor, com armamento leve, enquanto pela retaguarda drones voam seguindo os sinais vitais do guardião enquanto garantem sua proteção. O avanço só é contido quando algum homem bomba tenta se aproximar do guardião. As máquinas com precisão detectam e destroem seus alvos antes que as explosões possam causar algum dano aos atacantes. O recuo para as áreas centrais da cidade ocorre enquanto os soldados sobreviventes tentam um ultimo esforço desesperado para conter a arremetida do avanço inimigo. Casa a casa lutam em desespero homens e mulheres armados de fuzis de assalto, lança granadas, espingardas de caça de repetição, coquetéis molotov, e explosivo plástico para confeccionar os coletes dos mártires. Os heróis que serão lembrados pela cidade, se alguém depois sobreviver.
Os refugiados que tinham condições abandonaram a cidade há tempos, mas os mais pobres tiveram que se contentar em refugiar-se nos túneis do metro e subterrâneos dos prédios destruídos na primeira onda. O bombardeio aéreo silencia, a multidão escuta os disparos de artilharia cada vez mais próximos das forças de terra. Uma besta assoma pelo túnel e encara a multidão aterrorizada comprimida na estação e sem saída. Disparos de armas leves são ouvidos. Um homem bomba tenta se aproximar da máquina com seu acionador na mão mas tem sua cabeça e corpo dilacerado pelos disparos certeiros do robot causando uma grande explosão que atinge os civis. Do outro lado do mundo gritos de prazer são ouvidos na sala de controle. Ainda hoje será servido coquetéis e churrasco na beira da piscina, mais tarde, por terem cumprido sua cota. Precisam completar logo a operação de limpeza para finalizar seu turno e ir gozar a vida. Esta guerra não é apenas de conquista de territórios. Com recursos naturais cada vez mais limitados, as grandes corporações decidiram reduzir a população mundial. Os estados nacionais há muito são figuras simbólicas e seus políticos marionetes do poder econômico global e da tecnologia. Nesta era que encontra-se na próxima esquina do nosso tempo de agora, a automação ocupa todas as posições de trabalho e o desemprego é uma ameaça de instabilidade social constante, com rebeliões das populações, saques crescentes e surgimento de facções do crime organizado, cada vez mais fortes, uma ameaça constante contra os grandes detentores do capital, uma ínfima, mas poderosa, casta da raça humana. Por suspeitarem da ambição de seus generais, tinham deixado a guerra ser comandada por uma inteligencia artificial de ultima geração que deliberava como alto comando. Os dados foram analisados em profundidade pela memória quântica, com acesso à informação e controle cibernético sobre bilhões de pessoas no mundo todo, joia da tecnologia mais avançada da humanidade, sob exclusivo domínio do poder dominante. Não há duvida. Para garantir que a humanidade não seja extinta, conforme seus interesses, para que os poderosos possam manter seus santuários seguros e conservar suas riquezas longe do caos crescente, era necessário e urgente matar dois terços da humanidade, que se conta agora em muitos bilhões. O extermínio é vaticinado pelos terabytes, premeditado e planejado. Foi descartado o uso de armas nucleares para evitar um maior impacto num ambiente em franca deterioração. Várias causas para conflitos são fomentadas pelos meios de comunicação em todo o planeta. Comunidades inteiras sofrem ao serem demonizadas pelos donos dos meios de comunicação e seus algoritmos. Religiões e ideologias são perseguidas, seus seguidores aprisionados em campos de extermínio, lideres populares são assassinados ou presos com falsas acusações por juízes corruptos em calabouços de terror e tortura, armas de combate são facilitadas a preços módicos e distribuídas para as multidões sem esperança. Em algum momento as comunidades sobreviventes percebem seu derradeiro destino, de alguma forma devem resistir, a qualquer custo, fortificam suas urbes decadentes. Uma a uma as cidades com milhões de pessoas são paulatinamente destruídas em combates sangrentos, de forma metódica e mortal. Populações são extintas. Genocídio.
Máquinas penetram em todas as defesas da cidade dilacerando os corpos dos civis que buscam em terror onde se esconder. Através dos esgotos tentam romper as linhas inimigas e alguns tentam fugir para longe daquele inferno. Uma pequena multidão se acotovela pelos caminhos sinuosos e fétidos que se ramificam pelo subsolo da cidade. Alguns vão armados, mas a maioria são mulheres, velhos e crianças que não podem ainda entrar em combate. Não há choros, silêncio absoluto na multidão, mães sufocam seus bebes em terror, temem ser detectados pelos sensíveis sensores auditivos das bestas que infestam os tuneis.
No centro da cidade, na ultima linha de defesa ocorre ainda alguma resistência. Os defensores resistem como podem, sem munições de artilharia. O cerco aos poucos se fecha. Na praça central, o ultimo reduto, silencia o fogo, todos os defensores mortos. Não tiveram chance alguma e nunca pretenderam a rendição. Os guardiões se aproximam das barricadas, as bestas formam uma perímetro de defesa. O guardião chefe olha curioso para um veículo intacto e em bom estado, um caminhão tanque que tinha passado despercebido do controle aéreo, escondido completamente por sacos de areia e camuflagem. O guardião, parte humano, afasta de um só golpe as camuflagens e sacos que protegem o veículo com a super força de seus membros de aço e nota algo estranho. Um som baixo, um leve zunido que parte do depósito onde deveria estar contido algum liquido. A explosão do artefato nuclear artesanal, construído com esforço pelos técnicos da cidade, a liberação da energia explosiva tem seu epicentro na praça. Varre os autômatos dos atacantes, e dissolve a blindagem das armaduras dos guardiões de forma mortal. Um grande cogumelo de fumaça e cinzas toma conta de todo o centro da cidade, agora sem vida e abandonado. Os poucos sobreviventes, que escapam pelos esgotos se escondem, onde podem, fogem para as regiões montanhosas mais próximas, longe do controle aéreo inimigo, não existem mais cidades para se refugiar, sobrevivem para poder lutar mais outro dia amanhã...
* Todas as tecnologias de guerra expostas ou já existem e foram utilizadas em conflitos urbanos recentemente ou estão em fase final de desenvolvimento.
Fontes: Youtube
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