terça-feira, 26 de outubro de 2010

Da Guerra – Maquiavel, Clausewitz, Sun Tzu.


Maquiavel em seus diálogos sobre a “Arte da Guerra” redigido em 1520 colocou nas palavras de Fabrizio Colonna suas opiniões pessoais sobre como deveriam ser organizados os exércitos na Itália dividida em principados e sempre a mercê das potencias vizinhas. Fabrizio havia servido com honra ao rei de Espanha, uma potencia militar, onde havia combatido por muito tempo. A época de ouro de Roma estava sepultada há muito e só alguns registros do passado glorioso haviam sobrevivido pelas muitas invasões bárbaras que a península havia sofrido. O Renascimento evocava a nostalgia pelos “dias gloriosos” que os eruditos acreditavam ter existido no período Clássico, inclusive sobre a questão da organização marcial.

As máximas foram enumeradas para reflexão dos príncipes e condottieris com o objetivo de criar-se uma força nacional capaz de enfrentar os inimigos que faziam dos principados italianos suas presas indefesas:

1°) Tudo o que serve para o inimigo prejudica; tudo o que prejudica, serve.

2°) Aquele que se empenhar mais em observar os planos do inimigo e em treinar freqüentemente seu exército haverá de correr menos perigos e terá mais chances de esperar pela vitória.

3°)Nunca se deve levar os soldados ao combate, a não ser após tê-los deixado repletos de confiança, após tê-los treinado muito bem e estar seguro de que não tem mais medo. 
Enfim, nunca entrar em combate, senão quando tiverem esperança de vencer.

4°)É melhor triunfar sobre o inimigo pela fome do que pela espada. O êxito das armas depende muito mais da sorte do que da coragem.

5°)As melhores decisões são aquelas que se consegue esconder ao inimigo até o momento de colocá-las em execução.

6°)Uma das maiores vantagens na guerra é conhecer a ocasião e saber aproveitá-la.

7°)A natureza faz poucos bravos; na maioria das vezes, são feitos pela educação e pelo exercício.

8°)Vale mais na guerra a disciplina que a impetuosidade.

9°)Quando o inimigo perde alguns de seus soldados que passam para o outro lado, é grande a conquista se permanecerem fiéis ao novo exército. Um desertor enfraquece muito mais um exército do que um morto, embora o apelativo de trânsfuga o torne tão suspeito a seus novos amigos quanto àqueles que ele deixou.

10°)Quando se dispõe um exército em ordem de batalha, é melhor reservar reforços atrás da primeira linha do que espalhar seus soldados para ampliar o próprio front.

11°)É difícil vencer aquele que conhece bem suas forças e aquelas do inimigo.

12°)Na guerra, vale mais a coragem que a multidão, mas o que vale mais ainda são os postos vantajosos.

13°)As coisas novas e imprevistas espantam um exército, mas, com o tempo e o costume, cessa de temê-las. Deve-se, portanto, quando se tem pela frente um inimigo novo, acostumar suas tropas por meio de rápidas escaramuças, antes de se empenhar numa ação total.

14°)Perseguir em desordem um inimigo em fuga é querer trocar a vitória por uma derrota.

15°)Um general que não faz grandes provisões de víveres será vencido sem entrar em combate.

16°)Deve-se escolher o campo de batalha, de acordo com a maior confiança que se deposita na cavalaria ou na infantaria.

17°)Como descobrir se há um espião no próprio acampamento? Basta mandar que cada soldado se recolha em seu alojamento.

18°)Deve-se mudar subitamente as disposições, quando se perceber que o inimigo penetrou nas fileiras.

19°)Deve-se perguntar a muitos sobre que estratagemas tomar, mas não se deve confiar senão a pouquíssimos amigos o plano escolhido.

20°)Que durante a paz, o temor e o castigo seja o móvel do soldado; durante a guerra, a esperança e as recompensas.

21°)Um bom general nunca arrisca uma batalha, se a necessidade não o forçar a isso ou se a oportunidade for muito boa.

22°)Que o inimigo jamais venha a saber as disposições do dia do combate, mas qualquer que sejam, a primeira linha deverá sempre poder entrar na segunda e na terceira.

23°)Durante o combate, se não quiser provocar a desordem no próprio exército, nunca se deve confiar a um batalhão outra função, a não ser aquela a que estava destinado antes.

24°)Contra os acidentes imprevistos, o remédio é difícil; contra os acidentes previstos, é fácil.

25°)Soldados, armas, dinheiro e pão, esse é o cerne da guerra. Desses quatro elementos, os dois primeiros são os mais necessários, porque com soldados e armas se encontra pão e dinheiro, enquanto que com pão e dinheiro não se encontra nem armas nem soldados.

26°)O rico desarmado é a recompensa do soldado pobre.

27°)Deve-se acostumar os soldados a menosprezar alimentos requintados e ricos trajes.



Neste período, entre os séc. XIV e XV, o sistema de Terços usado pelos espanhóis e os alabardeiros suíços eram as organizações militares mais afamadas pelas suas vitórias em combate graças às formações compactas de piquetes, bestas, escudos e com a evolução bélica, o uso de arcabuzes, armas de fogo portáteis que davam cobertura para os alabardeiros, tornando custoso o avanço da cavalaria contra uma muralha de lanças afiadas e setas ou balas destruidoras em cerrada artilharia. Esse novo método de combate a pé inspirado nas antigas legiões romanas revolucionou os combates no fim da Idade Média e decretou a decadência da carga de cavalaria pesada como tática eficiente de batalha. 

Os suíços formavam quadrados imbatíveis onde os cavalarianos eram simplesmente empalados nas longas lanças ou mortos pelos besteiros que tinham tempo para a recarga protegidos pelos piquetes. A superioridade tática dos terços espanhóis em relação aos suíços era baseada na sua capacidade de fazer manobras e revoluções, subdividindo-se em unidades menores até o momento do combate corpo a corpo. Aos poucos as bestas foram sendo substituídas por arcabuzes pelos espanhóis. Sua formação original era de 10 capitanias com 300 soldados cada, sendo 8 de piqueteiros e duas de arcabuzeiros.


Desembarque nas Ilhas Terceiras

Era esse tipo de força que Maquiavel imaginava organizar para defender o solo pátrio italiano contra as constantes invasões promovidas por franceses e alemães, povos que ele considerava “bárbaros”. Deplorava o uso de mercenários e forças auxiliares compostas por estrangeiros, largamente utilizadas pelos príncipes, pois eram pouco confiáveis e quando não estavam em campanha ou deixavam de receber o soldo passavam a representar um perigo adicional contra as cidades e os campos com saques e destruições incontroláveis. Ele imaginava a criação de um exército nacional que pudesse ser mantido, composto de cidadãos soldados, fórmula de recrutamento que foi utilizada no período Clássico por gregos e romanos e tinha vocação republicana.

Os grandes quadrados de infantes e as manobras controladas ao som das bandas militares que marcavam as revoluções dos esquadrões evoluíram nos séculos subseqüentes para as divisões de infantaria de mosqueteiros e granadeiros em substituição aos longos piquetes. O mosquete no século XVII e XVIII era carregado pela boca e os esquadrões de atiradores formavam fileiras que atiravam em seqüência de tiro, isto é, enquanto uns atiravam uma saraivada mortal de chumbo, outros carregavam os mosquetes com balas e pólvora. O piquete foi substituído pela baioneta que no seus primórdios obliterava a boca do cano e impedia seu uso. A artilharia pesada tornou inúteis as couraças dos cavalarianos fazendo que os corpos de cavalaria fossem transformados em dragões, isto é, o arco curvo foi substituído pela pistola, o mosquete, e o sabre dando prioridade a mobilidade e rapidez de mudanças de direção para cavalarianos e montarias, como faziam os antigos mongóis, ora avançando, ora recuando conforme fosse mais conveniente e lutando desmontados se fosse necessário.


Clausewitz

No séc. XIX as manobras dos esquadrões ainda eram realizadas em blocos compactos e a evolução bélica no campo da artilharia atingiu precisão sem limite, os antigos mosquetes passaram a usar cartuchos o que tornava mais rápido o municiamento e posteriormente surgiram as metralhadoras e rifles de repetição para terror dos povos autóctones em regiões distantes do mundo que ainda viviam na era do arco e flecha e do mosquete de pederneira e a guerra passou a ser tratada pelos estrategistas como uma extensão da política numa Europa imperialista e dominante. Clausewitz, um oficial prussiano iria concluir sua obra “Da Guerra” onde expõe suas opiniões sobre os conflitos de então onde grandes massas humanas se jogavam de forma ordenada em direção das balas e metralhas dos canhões inimigos. A tecnologia da morte havia avançado, mas as táticas de combate continuavam as mesmas tornando as batalhas cada vez mais sangrentas a ponto de ficar cada vez mais difícil estabelecer quem era o vencedor e quem era o vencido nas batalhas, entre os exércitos das gananciosas nações européias. Transcrevemos abaixo suas impressões sobre o campo:


Batalha do Marne

“Do Perigo na Guerra”

“A idéia que formamos do perigo, antes de compreendermos seu verdadeiro significado, é mais atraente que repulsiva. Na euforia do entusiasmo avançar sem trégua sobre o inimigo – quem se recorda, então, de balas e homens caindo? Cego pela exaltação do momento lançar-se de encontro à morte fria, ignorando se a nós mesmos ou a um outro iremos mutilar, e tudo isso prestes a alcançar os dourados portões da vitória, próximo do rico fruto que o nosso desejo cobiça – poderá isso ser difícil? Não vai ser e, muito menos parecer difícil. Esses momentos, entretanto, não acontecem num único impulso; pelo contrário, assim como certos medicamentos tem que ser diluídos e transformados pela sua mistura com o tempo, tais momentos são raros”.



“Acompanhemos um jovem soldado ao campo de batalha. Conforme nos aproximamos, o ressoar dos canhões torna-se cada vez mais claro, logo sendo acompanhado pelo sibilar dos tiros, o que chama a atenção do inexperiente. As balas começam a golpear o solo próximo de nós, em frente a nós e na retaguarda. Corremos até à colina onde está o general e o seu estado maior. Aqui a constância que as bombas explodem e os dissabores causados pelas balas dos canhões – fazem com que a seriedade da vida se torne visível. Repentinamente, alguém que conhecemos cai – uma bomba explode em meio a multidão e causa movimentos involuntários. Começamos a perceber que já não estamos completamente a vontade e tranqüilos; até o mais valente está, pelo menos, um pouco confuso. Agora, um passo mais em frente na luta à nossa volta, que soa como uma cena de teatro, e chegamos junto do mais próximo general de divisão; aqui, uma bala atrás da outra, e o barulho das nossas próprias armas torna ainda maior a confusão. Do general de divisão, passamos ao brigadeiro, homem de reconhecida bravura, que se protege atrás de uma elevação de terreno, uma casa, uma árvore – sinal certo de crescente perigo. O fogo rápido da metralha esbraveja, sem controle, nos telhados das casas e nos campos, as balas de canhão assobiam sobre nossas cabeças, cortam o ar em todas as direções e logo há o constante sibilar das balas de mosquete. Mais um passo em frente, em direção às tropas, até essa corajosa infantaria que, há horas, se mantém firme sob o pesado fogo; aqui o ar está cheio com o silvo agudo das balas que anunciam sua chegada ao mesmo tempo que passam rente a orelha, a cabeça ou ao peito”.


Avanço da Infantaria Prussiana

“Para completar a visão dos feridos e dos mortos enche-nos de piedade e a compaixão faz com que nossos corações acelerem. O novato não consegue entender nenhuma dessas diversas formas de perigo, sem perceber que aqui a luz da razão não se move de maneira comum, que não é aqui retratada da mesma forma que na especulação teórica. Na verdade, um homem submetido, pela primeira vez a essas impressões precisará ser excepcional, para não perder o poder de tomar qualquer decisão instantânea. É verdade que muito rapidamente o hábito entorpece tais impressões. Depois de meia hora nessa situação, começamos a nos tornar quase indiferente a tudo o que acontece à nossa volta. Mas um temperamento normal nunca chega à total indiferença e à natural flexibilidade de espírito. Novamente sentimos que também aqui as qualidades comuns não são suficientes, pois se trata de algo que se torna tanto mais verdadeiro, quanto maior for a área de ação que deve ser coberta. Entretanto, muitas qualidades, como o estoicismo, a valentia natural, a grande ambição, ou a intimidade com o perigo, serão necessárias, se todos os resultados gerados nesse resistente meio não forem menores  daquilo que, no alojamento do novato, parece não passar do nível vulgar”.

“O perigo, na guerra, está relacionado ao seu atrito, e é preciso uma correta idéia da sua influência, para que haja um verdadeiro entendimento” 
( Capítulo IV – Da Guerra – Clausewitz)


Bateria de Mosquetes Inglesa

Com essas palavras, comedidas até, o estrategista oficial tenta explicar ao leigo como funcionava essa máquina de moer carne, cada vez mais eficiente e mortal que os exércitos europeus aprimoraram durante gerações para contentar a ambição de seus soberanos.

“Talvez a evolução superior dos arianos e dos semitas se deva à abundância de carne e leite em sua alimentação e, particularmente, pela benéfica influência desses alimentos no desenvolvimento das crianças. Com efeito, os índios 'pueblos' do Novo México, que se vêem reduzidos a uma alimentação quase exclusivamente vegetal, têm o cérebro menor que o dos índios da fase inferior da barbárie, que comem mais carne e mais peixe. Em todo caso, nessa fase desaparece, pouco a pouco, a antropofagia, que não sobrevive senão como um rito religioso, ou como sortilégio, o que dá quase no mesmo”. (Friedrich Engels)

Engels em função de sua educação vitoriana não consegue perceber seu equívoco. Imagina que pelo fato dos homens não comerem as carnes dos inimigos a antropofagia não mais existisse. Mas era justamente nas linhas de produção da mais valia e nas trincheiras das intermináveis guerras que ocorriam na Europa que o canibalismo se encontrava mais presente. Nem ele conseguia perceber o ritual sanguinário envolvido onde reis e sacerdotes com suas vestes põem em marcha suas procissões macabras de infantes em direção das metralhas e canhões de seus algozes num perpétuo sacrifício de sangue em nome da fé, da pátria, de dinastias imperiais, um holocausto de homens que acreditavam piamente no espírito das leis, nas crenças religiosas e em seus governantes. Se isso não é uma forma de antropofagia, o que mais poderia ser?


Exemplo clássico do pensamento dominante entre os aristocratas europeus é o famoso telegrama de Ems a Bismarck em 1870. O ponto em debate era saber se Leopold de Hohenzollern deveria ser o sucessor do trono espanhol, candidatura apoiada por Bismarck e a que se opunham os franceses. O rei Guilherme da Prússia e o embaixador francês tinham passeado juntos no agradável jardim de Ems discutindo o problema, embora a essa altura Leopold já houvesse desistido da candidatura, alarmado pela confusão criada, e a ameaça de guerra parecia já ter sido evitada. Bismarck porém queria a guerra e quando Guilherme enviou um telegrama cifrado descrevendo a conversa inofensiva que houvera em Ems, Bismarck e seus pares no principio ficaram decepcionados pelo seu conteúdo sem significação beligerante. Num segundo momento o chanceler percebeu a oportunidade de poder utilizá-lo para "salvar" a situação. Cortando algumas palavras e frases, e a seguir publicando seu conteúdo adulterado que dava a entender uma discussão abrupta e o desafio truculento com uma consequente repreensão. As alterações foram divulgadas para as imprensas de ambos os lados, que clamaram por guerra. Iniciou dessa forma a Guerra Franco-Prussiana, requiém da animosidade entre franceses e alemães que iria atravessar o séc XIX,  responsável pela morte de 141.000 homens.    

É na raiz das civilizações semitas e arianas que a antropofagia dos poderosos se traveste de culto religioso e os morticínios vão ser sempre justificados por um Deus e sua fé. Milhões de pessoas foram, são e serão servidas no holocausto das religiões para justificar o roubo de riquezas e a ocupação de terras alheias. O inimigo sempre será o infiel, aquele que não segue o dogma estabelecido e possui o espaço vital necessário que pretende os interesses do crente. O infiel precisa ser deslocado, morto, intimidado em nome do bem supremo. Sempre foi assim e sempre assim será, até que uma profunda revolução interior ocorra no coração da humanidade que seja de fato espiritual no seu sentido mais amplo e transforme o indíviduo. Como já denunciava Swift nas Viagens de Gulliver, Liliput e Labatut ainda hoje guerreiam para impor a forma correta de descascar um ovo, por qual extremidade seria?


Sun Tzu -

Quando o rei Chuang, de Ch'u, cercava a capital de Sung, em 594 a.C., a certa altura os mantimentos começaram a escassear, tendo o seu ministro da Guerra observado: "Se os mantimentos nos acabam antes de subjugarmos a cidade, teremos de voltar para casa".

O rei mandou que Tzu-fan subisse a rampa encostada à muralha, da cidade para apreciar os sitiados.

O príncipe de Sung enviou o seu ministro, Hua-Yuan, à muralha para o interceptar, tendo entre os dois ocorrido a seguinte troca de impressões:

Tzu-fan: "Como vão as coisas por aí?"

Hua-Yuan: "Estamos exaustos. Trocamos as crianças e comemo-las; partimo-lhes os ossos e os chupamos".

Tzu-fan: "Céus! Estão mesmo apertados! No entanto, tinham me dito que nas cidades cercadas era costume amordaçar os cavalos, quando lhes davam de comer, e enviar somente os ainda gordos ao encontro do inimigo. Como poderá o senhor ser tão franco?".

Hua-Yuan: "Consta-me que um homem superior sente compaixão quando vê outro sofrer e que o homem inferior se regozija com o sofrimento de outrem. Por isso fui franco".

Tzu-fan: "Assim é. Oxalá prevaleçam. O nosso exército tem rações para apenas sete dias".

Tzu-fan informou o rei Chuang da conversa, e este perguntou-lhe: "Como estão eles?"

Tzu-fan: "Exaustos. Trocam as crianças, comem-nas e partem-lhes os ossos para os chuparem".

Rei Chuang: "Céus! Estão mesmo apertados! Resta-nos vencê-los e regressarmos".

Tzu-fan: "É impossível. Já lhes disse que o nosso exército só tem rações para apenas sete dias".

Rei Chuang, zangado: "Mandei-te observá-los. Por que lhes disseste isso?".

Tzu-fan: "Se um Estado tão pequeno como Sung ainda dispõe de um súdito incapaz de mentir, como poderá Ch'u não ter um também? Foi por isso que lhe falei a verdade".

Rei Chuang: "Mesmo assim vamos vencê-los e regressar".

Tzu-fan: "Fique Vossa Majestade aqui. Eu, se mo permitirdes, voltarei para casa".

Rei Chuang: "Se fores para casa., deixando-me, com quem ficarei eu? Regressarei, como desejas".

E assim fez, acompanhando-o o Exército.



Pouco se sabe do autor ou quando foram escritos os 13 capítulos da “Arte da Guerra”. Alguns pretendem que foi em 500 a. C., no reino de Wu, outros em 300 a. C. Em 100 a. C. Su-ma Ch’ien um dos comentadores da obra forneceu alguns detalhes sobre seu criador. O mestre Sun Tzu, cujo nome particular era Wu, nasceu no Estado de Ch’I. Sua “Arte da Guerra” logo chamou a atenção dos soberanos.
Lida hoje por militares, guerrilheiros e executivos em todo o mundo, suas máximas colocadas em prática foram responsáveis por pelo menos dois reveses importantes das potencias ocidentais no pós II Guerra, na Coréia e no Vietnã. Hoje mergulhados no conflito sem fim do Afeganistão, os EUA e seus aliados europeus com absoluta superioridade material não conseguem enfrentar alguns guerrilheiros mal armados que se não tiraram inspiração na obra do chinês, por intuição ou tradição cultural dos povos milenares que ali habitam, seguem as indicações da luta de atrito, de baixa intensidade sobre mobilidade de forças, adaptação sobre o terreno, uso de inteligência, contra potencias que pretendem com sua superioridade bélica uma batalha definitiva ao estilo e ao gosto de Clausewitz que de fato nunca ocorre.


Blindagem pesada de cavalaria motorizada contra moral de combate, mercenarismo contra voluntarismo, profissionalismo contra jihadismo tribalista, força subterrânea contra superioridade aérea. São essas as polarizações táticas que após 2500 anos ainda são discutidas pelos estrategistas e tornam a obra de Sun Tzu tão atual. Erros históricos continuam sendo cometidos. O uso de tropas auxiliares mal treinadas compostas em sua maioria por mercenários criminosos e viciados em drogas que não conseguem angariar a confiança das populações dominadas e que fingem controlar o terreno de forma burocrática, empresas de segurança que se assemelham aos antigos condottieres da Itália de Maquiavel, compostas de assassinos profissionais que fazem o “serviço sujo”, praticando atrocidades contra os civis para garantir as propriedades dos invasores. Assim tem sido a ocupação estrangeira no Afeganistão e Iraque. Antigos fantasmas que o mundo imaginava sepultados definitivamente no séc. XX esqueletos ressequidos que exalam indiferença e desumanidade característica do mercantilismo do séc. XIX e a velha política das canhoneiras são novamente sacadas de baús carcomidos, pelas ditas “modernas democracias ocidentais” e  implementada pelos seus militares de carreira numa nova onda intervencionista. Carpideiras da mídia eletrônica evocam a “justa” vingança contra os atentados cometidos nas capitais do ocidente enquanto populações civis são mortas nas sombras em remotas áreas da Ásia com a conivência e beneplácito de todo o mundo dito “livre”. E a insurgência cresce cada vez mais.


Segundo Sun Tzu a “Arte da Guerra” é governada por cinco fatores: a Lei Moral; o Céu; a Terra; o Chefe; o Método e a disciplina.
A Lei Moral (o Tao) faz com que o povo fique de completo acordo com seu governante, levando-o a segui-lo sem se importar com a vida, sem temer perigos.
O Céu significa a noite e o dia, o frio e o calor, o tempo e as estações.
A Terra compreende as distâncias, grandes e pequenas; perigo e segurança; campo aberto e desfiladeiros; as oportunidades de vida e morte.
O Chefe representa as virtudes da sabedoria, sinceridade, benevolência, coragem e retidão.
Método e disciplina compreendem a disposição das divisões do exército, a hierarquia entre os oficiais, a manutenção das vias de acesso por onde os suprimentos devem chegar até às tropas e o controle com os gastos da campanha.
Esses cinco fatores são fundamentais para garantir a vitória ou condenar a derrota do general conforme a importância como são tratados.
Portanto para determinar as condições militares de qualquer conflito e estabelecer uma comparação entre os contendores deve-se perguntar:
Qual dos dois soberanos está impregnado com a Lei Moral?
Qual dos dois generais tem mais competência?
Com quem estão as vantagens do Céu e da Terra?
Em que lado a disciplina é mais rigorosamente aplicada?
Os sábios conselhos de SunTzu estavam impregnados com os conhecimentos milenares do taoísmo. Nessa perspectiva o grande objetivo da guerra é a vitória e não campanhas extensas.
Sun Tzu


Lutar e vencer em todas as batalhas não é a glória suprema; a glória suprema consiste em quebrar a resistência do inimigo sem lutar. Na prática arte da guerra, a melhor coisa é tomar o país inimigo totalmente e intacto; danificar, destruir não é o melhor. Assim também é preferível capturar um exército inteiro em vez de destruí-lo; capturar um regimento, um destacamento ou uma companhia sem os aniquilar.
A regra de ouro na guerra é esta: se suas forças estão na proporção de dez para um em relação ao inimigo, inste-o a render-se; se forem de cinco para um, ataque-o; se duas vezes mais numerosas, divida seu exército em dois: um para atacar o inimigo pela frente e outro pela retaguarda; se responder ao ataque de uma direção poderá ser esmagado em ambas as frentes.
Se estiver em igualdade de condições poderá apostar no enfrentamento; se ligeiramente inferior em número, deverá evitar o contato; se inferior em todos os aspectos deverá empreender a fuga. Embora uma força inferior possa oferecer uma resistência obstinada, essa acabará por ser capturada ou aniquilada pela força superior.
Oportunismo e flexibilidade são virtudes militares. Será vencedor quem souber quando lutar e quando não lutar.
Será vencedor quem souber como manobrar tanto as forças superiores quanto as inferiores.
Será vencedor aquele cujo exército estiver animado do mesmo espírito em todos os postos e posições.
Será vencedor quem, autopreparado, espera para surpreender o inimigo despreparado.
Será vencedor quem tiver capacidade militar e não sofrer a interferência do soberano, pois os atributos que favorecem um bom governo estorvam na condução da guerra e deixam intranqüilas as tropas.
Se conhecermos o inimigo e a nós mesmos, não precisamos temer o resultado de uma centena de combates. Se nos conhecemos, mas não ao inimigo, para cada vitória sofreremos uma derrota. Se não nos conhecemos nem ao inimigo, sucumbiremos em todas as batalhas.


Infantes